Luiz Carlos Hauly
Roteiro de uma chanchada
LUIZ CARLOS HAULY
Choque de gestão, déficit nominal zero, novo ministério, mais fisiológico do que nunca, e eis a salvação da pátria petista e de seu governo presidido por Luis Inácio Lula da Silva!
Enquanto isso, a onda avassaladora de denúncias faz soçobrar um por um os dirigentes petistas e, num lance mais próximo da ficção do que da realidade, embora realíssimo, um líder regional do partido, assessor do irmão do até há pouco presidente nacional da legenda, é flagrando em São Paulo com uma maleta recheada com 200 mil reais e a cueca estufada com 100 mil dólares.
O roteiro da chanchada está completo ou assistiremos ainda a novos lances de promiscuidade explícita praticada com recursos públicos? Neste caso, a classificação do filme seria de outro gênero.
O “cuecão assassino” (poderia ser este o título) teve, pelo menos, o mérito de inaugurar uma nova era na confecção de provas criminais. Foi-se o tempo do folclórico batom na cueca para dar lugar à modernidade realista do dólar na cueca. O PT tem todo o direito de requerer o registro da patente de tal inovação delituosa.
E, uma vez pego em com a boca na botija – perdão, com o dólar na cueca –, o PT troca toda a sua liderança, que mal toma posse e apregoa, como sendo a mais eficiente e inédita arma contra eventuais inclinações digamos mercantilistas de seus dirigentes, o estabelecimento de... um livro-caixa!
Mais: em outro ato do que promete ser sua (re)conversão à ética e à moralidade, o PT anuncia que irá sabatinar regularmente os ministros filiados à sigla sobre suas atividades e propósitos. O primeiro a ser convocado, segundo a nova direção do partido, será o ministro da Fazenda Antonio Palocci. Ele será duramente cobrado, segundo também a nova direção, sobre sua insistência, entre outras ações que tanto têm desagradado o partido, de gastar menos do que se arrecada. Pecado mortal!
Em outras palavras, quando o partido está caindo pelas tabelas e o mesmo acontecendo com o governo federal, o PT decide instalar um autêntico tribunal da inquisição.
Ora, se todos os ministros pertencentes à sigla estão sujeitos a ser julgados por tal tribunal, é de se supor que, uma vez autodotado de superpoderes, o PT também convoque o chefe dos seus ministros, o presidente da República. Neste caso, o que lhe seria perguntado? Além de trivialidades como, por exemplo, “o senhor estava informado do mensalão?”, os Torquemadas petistas ousariam impor ao presidente, como condição de não levá-lo às chamas, uma mudança radical em seu estilo de agir?
Ficção à parte, a realidade de fato exige uma radical mudança na administração federal. Não são factoides como “choque de gestão” e outras manobras diversionistas que irão tirar o governo petista da areia movediça da desconfiança. É preciso, em primeiro lugar, que o presidente Lula se convença, de uma vez por todas, que a função de um presidente é governar. E governar é administrar. Administrar é identificar os problemas, escolher as soluções e aplicá-las no mais curto espaço de tempo possível.
A fase de líder sindical, da qual Lula tanto de orgulha, e até com razão, está suspensa. Suspensa também está sua condição de candidato, suspensão que, pelo andar da carruagem, deverá levar muito tempo para ser revogada.
Este seria o final feliz deste roteiro. Se não for seguido – e o tempo urge – o PT e Lula serão consumidos implacavelmente pela fogueira da incompetência, vaidade e violação da ética que eles mesmo acenderam.
LUIZ CARLOS HAULY (PSDB-PR) é membro da Comissão de Finanças e Tributação da Câmara dos Deputados