Luiz Carlos Hauly
Explique-se, senhor presidente
LUIZ CARLOS HAULY
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva está em débito com a Nação: ele precisa esclarecer, o mais urgentemente possível, o verdadeiro sentido do comentário que fez no Espírito Santo sobre a informação que teria recebido de um “alto companheiro”, responsável por uma empresa estatal, que o alertou sobre corrupção eventualmente ocorrida no processo de privatização adotado no governo de seu antecessor, Fernando Henrique Cardoso. Diante de tal alerta, o presidente – segundo suas próprias palavras – recomendou que o informante “fechasse o bico”.
Não se pode esperar que o presidente seja detentor dos dons da inerrância e da infalibilidade. Mas de um presidente se espera a responsabilidade por seus atos e palavras e, na eventualidade de ele ter cometido um erro e ser alertado a tempo para este fato, a magnanimidade da humildade, que consiste no elementar pedido de desculpa.
Lula não emitiu, no entanto, nenhum sinal de que esteja propenso a se curvar à realidade. A realidade nua e crua de que suas palavras corroem a sua credibilidade como chefe de Estado. Pois na condição de presidente da República ele jamais poderia ter mandado silenciar sobre um caso de corrupção. Agindo dessa forma, como admitiu no Espírito Santo, ele cometeu crime de responsabilidade.
E os crimes de responsabilidade, prevê a Constituição, são punidos com a perda do mandato.
A acusação não poderia ter provocado outra senão a reação do PSDB – partido ao qual pertence o ex-presidente FHC, de interpelar o presidente junto ao Supremo Tribunal Federal para que esclareça se disse realmente o que disse ou se o que disse não era o que realmente queria dizer. Na esfera política, o PSDB apresentou na Câmara o pedido de abertura de processo contra o presidente por crime de responsabilidade.
Os destemperos verbais de Lula são públicos e notórios e muitos deles já se incorporaram ao folclórico político, mas outros criaram embaraços diplomáticos e políticos. O mais recente é também o de maior gravidade, pela dimensão do erro que o presidente admitiu ter cometido. Pois de um presidente jamais se pode esperar que acoberte um crime, seja ele de que ordem for. E corrupção é um crime gravíssimo, de lesa-pátria.
A mais atenuante das hipóteses sobre o que levou Lula a esse paroxismo oratório é o emprego inadequado das palavras, risco a que estão sujeitos todos os que discursam de improviso, notadamente aqueles que não têm preparo suficiente para tal tarefa, que exige conhecimento do que se está falando e dos recursos estilísticos para expor o raciocínio com clareza, objetividade e precisão. Lula é um exímio orador – desde que a platéia seja formada única e exclusivamente por petistas, que é o ambiente no qual o presidente forjou o seu universo intelectual, político e social.
O que importa, neste momento, é que o estrago está feito. Diante deste fato consumado, Lula tem uma entre duas opções: ou se retrata ou confirma o que disse.
Confirmando suas próprias palavras, o presidente terá de se submeter à Justiça, ao Congresso e à História, mas estará permitindo que se investigue a suspeita de corrupção no governo do seu antecessor. Suspeita, aliás, que os líderes do PSDB querem esclarecer, pois protocolaram pedido de abertura de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o processo de privatização aplicado no governo anterior e para apurar o escândalo do assessor de Lula, Waldomiro Diniz.
Retratando-se, Lula estará enriquecendo sua presença na História, pois a humildade é a mãe de todas as virtudes e se torna ainda mais nobre quando é observada por um chefe de Estado.
LUIZ CARLOS HAULY (PSDB) é deputado federal pelo Paraná.
Publicado em 25/03/2005, no site Campo Grande News e site PSDB